domingo, 29 de dezembro de 2013

Anderson grita, a plateia se lambuza

FOTO SXC
Nunca entendi as lutas. 

Quando adolescente, via incrédulo a exaltação que se fazia na mídia a Maguila e a Mike Tyson, dois seres com dificuldade de completar uma frase. Me enojava a febre de "Rock" no cinema (que nunca acabava e se repetia em versões 2, 3, 4...). Stalone sangrando e desfigurado vestindo aqueles shorts com a bandeira americana era para mim mais que um insulto à inteligência, mas também à humanidade.

Meu raciocínio era (e continua sendo) simples, ingênuo: bater em outro ser, fazendo-o sentir dor até cair, não pode ser algo aceitável. Menos aceitável, ainda, é transformar isso em uma arena rodeada de fãs insanos, formando um circo que gera enormes lucros aos grupos empresariais envolvidos.

Acabou o tempo do boxe, mas chegou o tal MMA. Sinceramente, não sei e nem quero saber a diferença entre eles, porque me basta o que ambos têm de igual: a violência travestida de esporte e cultuada como um programa de entretenimento, para ser visto com a família no sofá, comendo pipoca enquanto o sangue escorre nos rostos dos "esportistas".

Claro que não vi a luta desta madrugada, mas é impossível ficar imune ao bombardeio do noticiário sobre os gritos de Anderson Silva e a multiplicação de imagens de sua perna deformada por uma fratura. É bizarro como a mídia se lambuza em todos os momentos: antes, divulga a luta, gerando expectativa para um "programão"; durante, exibe-a de forma triunfal, tal qual se fazia no Coliseu; e, depois, rumina os louros de quem ganhou, a humilhação de quem perdeu e também os detalhes mórbidos de quem se feriu gravemente. Em todos os momentos, lucra.

As fotos, os vídeos e as palavras que se publicam sobre a dor de Anderson Silva mostram uma mídia que saliva diante da tragédia. E uma sociedade onde a violência está no topo do interesse - e do lucro. Tal qual nas novelas e séries, em que a vingança rende o melhor ibope, no esporte não basta a disputa: é preciso sujá-la com o sangue, incrementar ossos quebrando e gritos de desespero.

Não, eu não acho que a humanidade piorou em relação a um passado em que se colocavam inocentes para serem devorados por feras no Coliseu, ou quando se queimavam pessoas em praça pública em nome de Deus (tudo isso com plateia empolgada). Mas também não melhoramos muito. Dentro das arenas pós-modernas (inclusive templos religiosos), em volta delas e nos meios eletrônicos por onde tudo isso flui, continua sendo a violência uma divindade cultuada.

Três séculos atrás, Rousseau disse que o homem e a mulher nascem bons, mas acabam sendo transformados em maus pela sociedade. Freud, no início do século XX, explicou que temos pulsações pela vida e pela morte dentro de nós. Hoje, a neurociência tem descoberto que nosso cérebro responde positivamente a atos de generosidade. Quem sabe sejam lampejos de esperança consciente em um futuro menos violento...

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Globo toma um fora de Porchat



Fabio Porchat, o talento do Porta dos Fundos, acaba de recusar um convite da Globo para comandar o programa de Fátima Bernardes durante as férias da titular (clique aqui para ver notícia do IG.) Ele alegou falta de disponibilidade, mas os motivos são muito maiores que este.

Na verdade, eis um exemplo contundente do novo modelo de comunicação de massa que se desenha. 

Ao recusar trabalhar comandando um programa global, Fabio Porchat está mostrando saber que o futuro não está no velho modus operandi de tantos impérios decadentes de comunicação, entre os quais a Globo, onde as novelas são todas iguais (e cada vez piores), o Jornal Nacional sempre pende para o mesmo lado e todo Natal tem o mesmo Roberto Carlos com as mesmas canções, começando entoando "quando eu estou aqui" e terminando com "Jesus Cristo". 

O futuro está em outras conexões e ancorado em outra vocação comunicativa, onde não existe emissor onipotente e receptor passivo-idiota. Está na interatividade e na liberdade de criar, de que desfruta, por exemplo, o Porta dos Fundos, e em que "delicados" aos puritanos não são censurados e substituídos pelos estereótipos do status quo

Esse contexto, aliás, não é mais futuro, já é presente e realidade irreversível. 

Antes da internet e das mídias sociais, o Porta dos Fundos seria um Casseta e Planeta, que precisava se submeter às imposições de um canal de TV para existir. Mas, hoje, a mesma Globo que enquadrou os cassetas e os jogou fora quando não mais serviam aos seus interesses levam um retumbante NÃO de Porchat. E levarão muitos outros, pois na era digital o monopólio da criação não existe e se gera receita com criatividade livre.

Porchat tem mais o que fazer do que dar atenção à Globo. Ele olha para frente.