sábado, 19 de outubro de 2013

Os beagles, entre o passado e o futuro


Fazia anos que entidades ligadas à defesa dos animais denunciavam os testes ocorridos no Instituto Royal e nenhuma instância dos poderes constituídos tomaram qualquer providência, de fato (claro, essas instâncias existem para atender interesses humanos, e só). Então, os ativistas arregaçaram as mangas e entraram no instituto, resgatando com as próprias mãos os cães que eram usados como cobaias para a fabricação de produtos da indústria dos cosméticos, por exemplo.

Praticaram crime ao invadir uma propriedade privada? Furtaram? Poderão ter de enfrentar tribunais por isso? À luz da lei, sim. Mas, também à luz de leis, por muitos anos pessoas de pele negra podiam ser escravizadas, acorrentadas, surradas e torturadas. Foi preciso haver gente como esses ativistas, que transcendesse as "regras vigentes", para se mudar um absurdo que era legalizado, dada a "conveniência" do status quo.

Da mesma forma que os cientistas que defendem o uso irrestrito de animais em pesquisas dizem que, sem usar bichos como cobaias, não nos curaríamos de doenças, os fazendeiros escravistas do sul dos Estados Unidos, por exemplo, ou fazendeiros brasileiros, também não viam nenhuma possibilidade de tocar seus negócios e produzir alimentos sem acorrentar os negros e fazer com eles o que bem entendessem. Precisou alguém romper as cercas, os muros e colocar luz na questão, possibilitando outras formas de trabalho.

Essa é a diferença entre os reacionários e os progressistas. Aos reacionários, o que existe não pode mudar e deve-se sempre olhar para trás, enquanto que, para os progressistas o único caminho é ir pra frente, nem que para isso se necessite mudar posturas, padrões, quebrar tradições.

Por falar em reacionários, a Veja, baluarte do pensamento ultraconservador do Brasil, acaba de dar sua sentença sobre o caso dos beagles retirados do Royal (não vou postar o link, pois não devemos lhe dar ibope): os ativistas, para a revista dos Civita, são "bandidos e baderneiros que deveriam ser presos". Eis a cegueira de uma publicação arrogante que só sabe olhar para trás, nunca para a frente.

A ciência já descobriu que animais sentem dor e medo, tal qual os humanos. Já descobriu que eles desenvolvem laços de afetividade inclusive com humanos. A ciência também já criou computadores capazes de simular experimentos com mais exatidão que cobaias. Então, o que ainda estamos fazendo ao ferir vidas cruelmente em nome de uma arrogante superioridade, bem num tempo em que a palavra de ordem é a sustentabilidade entre as espécies? Temos o direito de queimar os olhos de um coelho ou rasgar a língua de um cão para aprimorar o creminho que passamos nas mãos para ela ficar mais hidratada? Temos o direito de destruir a pele de um beagle para melhorar a pomada antirrugas que passamos no rosto, porque não aprendemos sequer a envelhecer e nos drogamos, nos cortamos, nos esfolamos para parecer sempre jovens?

Os ativistas que retiraram os cães do Instituto Royal estão à frente do nosso tempo, por isso enfrentam resistências da porção atrasada da sociedade. Eles vislumbram um mundo onde é possível conviver com as espécies sem escravidão e com respeito à mãe que nos une e está acima de todos nós: a Terra, tão machucada pelos experimentos da "suprema" ciência. E eles estão certos, pois um mundo sustentável não é só possível como necessário. Desnecessários são os reacionários, sempre a nos puxar para o passado.

9 comentários:

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  2. Sensacional sua analogia. Adorei. Nota mil !!!

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  3. deixe me ver se entendi, vc compara Cães com Negros.

    Maus tratos, realizados sem legislação em humanos por humanos, por maus tratos legalizados e bancados por pessoas como vc e eu.

    ok entendi.

    Agora quem libertou os Negros, CONQUISTOU AS COISAS, VENCEU A SOCIEDADE SEMPRE PREGOU O PACIFISMO....

    A NÃO VIOLENCIA E A CONVERSA....!

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  4. Anônimo (pode se identificar, tá?), eu comparo VIDAS COM VIDAS. E ESCRAVIDÃO COM ESCRAVIDÃO. Da mesma forma que vencemos um tipo de escravidão humana (a dos negros), podemos vencer a escravidão que se realiza com a vida animal. Não sei quanto a você, mas eu procuro banir do meu dia a dia qualquer consumos que envolvam maus-tratos. Sei que isso é difícil numa sociedade que ainda vive da exploração animal, mas é preciso começar a fazer algo! Não à violência contra todo tipo de vida!

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  5. * Um reparo de concordância: quaisquer.
    E quando convido a se identificar é porque toda opinião é bem-vinda e não há necessidade do anonimato. Vivemos uma democracia e o blog é seguidor dela.

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  6. ótimo texto!! Concordo plenamente com vc! Vou compartilhar, posso?? Abraços,

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  7. parabéns pelo texto com a clareza de sempre, em que consegue expor com muita inteligência e sensatez o que sentimos.

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